COBERTURA | Circuito Penedo de Cinema: Terceiro dia

Texto por Janderson Felipe e Leonardo Amaral. Revisão: Larissa Lisboa e Paulo Silver. Fotos: Divulgação

No terceiro dia do Circuito Penedo de Cinema ocorreu a primeira sessão do 10º Festival do Cinema Brasileiro, assim como a continuação do 7º Festival de Cinema Universitário e da 4ª Mostra Velho Chico de Cinema Ambiental.

Os filmes do segundo dia da Mostra Velho Chico tem a juventude como tema, com personagens na infância e na adolescência, e a importância da preservação da água. A começar com as crianças, como no filme A Piscina de Caíque (de Raphael Gustavo da Silva), que oferece uma história simpática devido às personagens infantis, mas que apresenta inconsistências de tom por alternar de forma abrupta entre o drama familiar e a comédia infantil dentro de uma abordagem datada. Em Animais (de Guilherme Alvernaz) , por outro lado, há coerência naquilo que se quer passar a partir de um roteiro bem amarrado sobre humanos animalescos em tempos de seca e uma ótima técnica de animação que pode parecer grosseira, mas se relaciona de forma efetiva com o tema, além do refino em sua execução. Entre as gerações há Arrudas (de Sávio Leite), um filme experimental que se utiliza da técnica de stop motion para demonstrar a agressividade da urbanização sobre a natureza. Entramos na adolescência, começando por Lameirão (de Gabriel Coimbra, Rafael Rodrigues e Rodrigo Lacerda), que tem a intenção de exercitar uma poética sobre o relacionamento do jovem com a conservação pela região de Delmiro Gouveia, seguindo para Manancial (de Bruno Soares), que trabalha um conflito entre duas realidades de uma cidade do interior voltada para o agronegócio e como jovens de classes e vivências distintas lidam com o meio ambiente.

Cena de Animais com direção de Guilherme Alvernaz.

Em Pedro e o Velho Chico (de Renato Gaia) há implicações maiores que as citadas nos outros filmes, entre elas a utilização de esteriótipos negativos que não mais cabem dentro da cinematografia brasileira, como representar um personagem negro idoso de forma estritamente caricata, numa falsa relação de cumplicidade entre uma família de classe média e o catador de lixo, ainda mais por se imaginar que tal filme tem como proposta atingir e ensinar o público infantil, o que pode reverberar em consequências ainda maiores para as crianças. Produzido e financiado por um dos patrocinadores da mostra, o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, Pedro e o Velho Chico se apresenta como um corpo estranho dentro da competitiva Mostra Velho Chico de Cinema Ambiental.

O 7° Festival de Cinema Universitário continua ineficiente na construção de uma narrativa e manutenção de um ritmo que abrace as linguagens dos filmes que o compõem, até mesmo esvaziando a sessão seguinte. O primeiro filme do Festival se mostra especialmente deslocado dos demais, Relicta (de Sergio Robson) é uma videodança alongada para além do necessário, mas que supondo uma montagem enxuta poderia impulsionar algumas escolhas fotográficas da obra. Enquanto o filme que encerrou a essa sessão universitária, Raiz Sob a Flor (de Humberto Schumacher), documentário que se utiliza de um tema de comum conhecimento como é a ditadura militar, foi de difícil conexão devido a sua montagem vacilar na criação de um vínculo das suas personagens. Filme de Apartamento (de Rafael Simões e Vitória Melo), por sua vez, baseia-se em brincadeiras com vícios de criação cinematográfica, vezes interessantes, outras gratuitas e que podem ser entendidas como alfinetadas de mal gosto a temáticas de produções atuais. Desaparecido (de Guili Minki), um filme em busca de brincar bastante com códigos clássicos da comédia romântica, sendo por muitas vezes espirituoso em sua comicidade, porém por tanto brincar com esses códigos acaba por cair em certas armadilhas do gênero que podem ser lidas de forma deslocada.

Realizadores apresentando os filmes na segunda noite no Festival de Cinema Universitário de Alagoas.

Dois filmes universitários se assemelham por se limitarem a um único ambiente. Luto (de Edu Camargo), que se passa todo dentro de um quarto no contexto de manifestações políticas, se viu prejudicado por restrições sonoras da captação do filme que impediram sua total compreensão, ainda que a imagem se apresente suficiente para entender a ideia central. O segundo, Fervendo (de Camila Gregório), foi o destaque desta sessão da mostra universitária. Um filme criativo em sua cinematografia, construída de forma que torna um pequeno espaço, um banheiro, em um complexo ambiente. O curta traz também elementos contemporâneos como filmagens de Snapchat a partir do celular das personagens, construindo um filme potente apesar do roteiro truncado que impede uma progressão mais fluída.

Fervendo é o primeiro filme dirigido por Camila Gregório.

Sendo prejudicado pela curadoria do dia, o 10º Festival de Cinema Brasileiro sofreu um esvaziamento de público. Teve início com Manifesto Porongos (de Thiago Köche), um documentário que revisita a rebelião farroupilha e resgata a contribuição dos negros na formação da sociedade gaúcha, porém sofre com uma montagem que falha em direcionar argumentos e uma construção desconjuntada de suas personagens, onde a progressão não nos leva de forma coesa até o clipe que encerra. O último filme da sessão também foi um documentário, Super Frente, Super-8 (de Moema Pascoini) homenageia cineastas e obras que nasceram através da utilização do Super-8, revisitando filmes dos entrevistados e lhes permitindo experimentar mais uma vez com câmeras Super-8.

Representantes dos filmes da primeira noite do Festival de Cinema Brasileiro.

Essa primeira sessão do Festival de Cinema Brasileiro apresentou dois filmes alagoanos: Os Desejos de Miriam (de Nuno Balducci), uma reflexão sobre a incomunicabilidade de uma mulher de classe média num mundo hiperconectado, que em determinados momentos atinge plenamente seus objetivos graças a uma montagem cadenciada que nos absorve no ritmo do cotidiano solitário de Miriam. Seguido por Teresa (de Nivaldo Vasconcelos), que inclusive foi destaque da sessão, um estudo de personagem de proporções e intensidades bíblicas ao incorporar em sua montagem e fotografia simbologias cristãs, criando então um limiar entre o sagrado e o profano.

Os desejos de Miriam de Nuno Balducci

A sessão encerrou com o filme convidado Os Olhos de Arthur (de Allan Deberton), sobre um jovem que, durante uma aula de natação, se vê confrontado pelas possibilidades do futuro, interpretado pelo ator André Campos que esteve presente no início da sessão junto com os demais realizadores dos curtas das mostras competitivas.

Hoje haverá debate com os realizadores de 16:00 em frente a Casa da Aposentadoria., a Mostra Velho Chico de Cinema Ambiental terá seu último dia de 14:00 assim como a de Cinema Universitário de 20:30, além de se iniciar o segundo dia de 19:00 do 10º Festival do Cinema Brasileiro.

Para saber mais sobre o Circuito acesse: http://circuitopenedo.iecps.com.br/

1 Comentário em COBERTURA | Circuito Penedo de Cinema: Terceiro dia

  1. Queridos Janderson e Leonardo, gostaria de expressar meu respeitoso sentimento acerca do posicionamento de vocês sobre meu filme. Já não resta dúvidas do que aquilo que colocaram trata-se de um tema mais que pertinente, tal como tantos outros que nos são não menos urgentes. No entanto, não deixa de ficar em mim a sensação de superficialidade no que escreveram.

    Sinto carência profunda acerca da crítica cinematográfica. De antemão, peço desculpas se estou sendo excessivamente duro! Porém, foi deixado de lado a premissa mais básica do filme, que é a nossa atual vida política. E muito mais que isso, trata sobre a superficialidade estúpida da qual vivemos dentro deste tema. Desta maneira, não vejo melhor definição como um filme que aborda e, acima de tudo, deixa às claras o tamanho da estupidez masculina, tal como nós homens lamentavelmente costumamos praticar em diversos contextos.

    Por sua vez, suponho que hão de convir que, ao contrário dos homens, esta mesma estupidez não é um meio onde mulheres de fato costumam transitar. Portanto, não faz sentido a colocação de vocês, uma vez que o filme não propõe apresentar heróis clássicos, impondo e reforçando a questão que vocês abordaram. Não vejo em sua narrativa ficcional espaço para, digamos, “taxistas mulheres”. Afinal, elas não perpassam neste contexto caricato de imbecilidade. Não as enxergo tratando com a mesma ignorância os mesmos conflitos tratados no filme pelos personagens masculinos. Em vista disso, dentro de sua verdadeira proposta, devo dizer por fim que meu filme é sim extremamente masculino.

    Abração!

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