Mostra marginAL chega à segunda edição comprovando diversidade da produção local

Foto: Alexandre Oliveira (“Sinopse”/Divulgação)

Assim como foi o Festival de Penedo para o ciclo do super-8, a atual safra do cinema alagoano tem encontrado amparo em eventos como Mostra Sururu, o Festival de Cinema Universitário de Alagoas e, mais recentemente, a Mostra MarginAL, cujo foco são os chamados “filmes B”.  Independente do recorte, estes espaços de exibição garantem a oportunidade para que os realizadores mostrem seu trabalho ao público todos os anos. Injetam incentivo e proporcionam uma amostragem do modo como os artistas locais pensam o lugar onde vivem.

Mas ao contrário dos demais festivais, a MarginAL atente a uma demanda específica. Numa prova da diversidade que caracteriza a recente produção alagoana, o evento chega à segunda edição com uma programação robusta, totalmente voltada para o cinema underdround. O evento, que foi realizado pela primeira vez no Museu da Imagem e do Som de Alagoas (Misa), surgiu em 2013 justamente da inquietação de um grupo disposto a dar visibilidade às produções de fora do circuito convencional. Segundo a jornalista Bárbara Pacheco, que idealizou e produziu o evento junto ao também jornalista Luiz Buzugo, a recepção surpreendeu, com um público maior do que o esperado.

Com início nesta sexta-feira (18), a segunda edição conta com nova casa: o Centro Cultural Arte Pajuçara. Outro diferencial é que acontecerá em dois dias, com o intervalo de uma semana entre um e outro. A última noite do evento será na sexta-feira seguinte (25).

O Audiovisual Alagoas conversou com a Bárbara para antecipar um pouco do que será visto nos quatro dias de programação. Leia a entrevista a seguir.

Audiovisual Alagoas: Como a mostra surgiu?

Bárbara Pacheco: A marginAL surgiu como parte do Trabalho de Conclusão de Curso que fizemos, eu e Buzugo. Em 2012, decidimos fazer um projeto relacionado a um tipo de cinema diferente do que geralmente é produzido no estado, um cinema movido pela ideia do “faça você mesmo”, com o qual já tínhamos contato. Com isso na cabeça e certos de que havia uma galera fazendo esse tipo de produção no estado, criamos a mostra dentro da ideia do TCC. A primeira edição aconteceu no MISA e foi uma surpresa para nós, com um público maior que do estávamos esperando.

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Bárbara Pacheco protagoniza o curta metragem “Sinopse”, do diretor Wladymir Lima. Foto: Alexandre Oliveira (“Sinopse”/Divulgação)

AA: Que avaliação vocês podem fazer desse cinema alagoano marginal? Está crescendo? Está evoluindo?

BP: Cada vez mais temos nos deparado com filmes realizados nessa pegada, com uma produção simples, feito com a ajuda de amigos, sem tanta burocracia e feitos realmente com os recursos disponíveis e equipamentos acessíveis. Todos os filmes selecionados para a marginAL foram realizados de 2013 pra cá, o que reforça essa ideia de crescimento. Além disso, a gente percebe uma evolução sim, com realizadores tentando se aprimorar, observando aspectos que poderiam ficar melhor e procurando divulgar suas obras cada vez mais. A nossa avaliação é bem positiva, já que se sabe que as dificuldades são grandes e o esforço é proporcional pra que saia algo interessante, que desperte a curiosidade de mais gente assistir.

AA: Como os filmes são feitos? De que formas são viabilizados e produzidos?

BP: Os filmes são feitos com muita força de vontade, geralmente com verba mínima e quase sempre sem muita divisão definida de função entre a equipe, que conta com amigos, não necessariamente profissionais da área. Cada um que queira participar do filme se encaixa em uma ou mais funções, ajuda como der, com figurino, arte, equipamento ou habilidade. Temos produções muito bem feitas no que se propõem e que se utilizaram de poucos recursos. Quem chega com a grana geralmente é o/a produtor/a e essa quantia é usada com coisas básicas como alimentação, transporte, aluguel de equipamentos etc. Ninguém ganha cachê, valor definido, assina contrato, essas coisas.

AA: Vocês lidam com algum tipo de preconceito ou resistência tanto para fazer os filmes como para exibi-los?

BP: Talvez um preconceito baseado em padrões, tipos de história contada, formatos de imagem e som, e por aí vai. Ainda assim, filmes que não entrariam em mostras ou festivais em outras épocas, agora estão ocupando mais estes espaços existentes no estado. Isso ajuda a quebrar essa ideia de resistência às propostas alternativas, o que abre um leque de possibilidades na seleção dos filmes e deu oportunidade de muita gente mostrar que estão aí na atividade, fazendo filmes no perrengue, com o que têm. Acreditamos que esse tipo de filme pode e deve ocupar os espaços, e isso tem sido feito como resultado de quem corre atrás da exibição. Sabemos que há um público de cinema tradicional no estado, que preza pelas produções convencionais, mas também sabemos que há um público que consome e se interessa por esse tipo de filme. No mais, tudo o que é alternativo, que quebra paradigmas e ousa fugir da tradição tende a ser algo menos aceito, embora seja inevitável que exista.

AA: Quais os critérios usados para compor a programação?

BP: A gente selecionou os filmes de acordo com a proposta da marginAL, independente dos gêneros e do tempo de duração. Temos curtas, médias e um longa-metragem. Os critérios que a gente usou são basicamente o que percebemos ser comum a esse tipo de produção: baixíssimo orçamento, equipe formada por muita gente que não é profissional de cinema, formato colaborativo, participação direta de amigos, uso de alguns equipamentos artesanais, liberdade criativa em relação aos temas e o ideal do “faça você mesmo”.

AA: O que a mostra ganha indo para o Arte Pajuçara?

BP: Ganhamos filmes alternativos na telona de uma sala de cinema de verdade! E o melhor, com entrada gratuita, como sempre imaginamos a marginAL. Além disso, a mostra passa a ter uma visibilidade maior, já que vai ser exibida em dois dias em um espaço cultural já consolidado aqui na cidade, o que pra nós é uma honra. Ocupar o Cine Arte Pajuçara, espaço que carrega uma imagem muito forte de ser uma alternativa às grandes redes de cinema da cidade, é muito bom para a mostra.

AA: Por que vocês acreditam que grande parte desses filmes não circula também em outros festivais? Os diretores inscrevem?

BP: Acho que boa parte dos festivais carrega uma ideia de competição, o que talvez não seja a proposta desses filmes. Além do mais, as produtoras são pequenas e não dispõem de tanto recurso técnico, limitando a qualidade da produção e encontrando barreiras para que os filmes sejam aceitos em certos padrões de exibição. Alguns diretores tentaram se inscrever, mas não foram aprovados; outros já encontravam dificuldade em cumprir as exigências de alguns editais, o que complicava a inscrição no evento.

Mas com certeza há o interesse dos realizadores em participar. A coisa mais importante depois do esforço em deixar o filme pronto é fazer ele circular, e o ponto inicial são as mostras que já abrigam esse tipo de produção. Alguns dos filmes desses realizadores já foram exibidos em cidades como Goiânia, São Paulo e Florianópolis, em espaços dedicados a essas produções, onde há uma possibilidade de alcance e muita troca de experiência. Mas há, sim, quem se interesse em colocar o filme pra rodar em outras mostras e festivais; há quem se inscreva.

AA: Os cineastas têm pretensões maiores? Pensam em concorrer em edital? Pensam em fazer longas?

BP: Acredito que os realizadores tenham pretensões maiores, mas principalmente em adquirir experiência, em se aperfeiçoar naquilo que propõem, além de circular seus filmes em outras mostras com o perfil da marginAL. Participar de editais é sim uma possibilidade, mas apenas mais uma opção, já que se sabe que, na realidade, esse tipo de filme nem sempre tem espaço em seleções de edital. Mas acreditamos, e um dos objetivos da marginAL é este, que os diretores possam e devam ocupar esses espaços e experimentar outros canais.

Quanto a longas, já existe gente se arriscando nesse formato, um exemplo é o filme Zona Trash, que vamos exibir na segunda data da mostra.

AA: A maioria dos filmes são inéditos. O que nós podemos esperar deles? Quais são os destaques? É possível observar evoluções em relação aos trabalhos anteriores das equipes?

BP: Muita sinceridade e paixão pelo cinema, depois autonomia criativa e liberdade técnica junto a muita força de vontade. Observamos sim uma evolução nos filmes de realizadores que participaram da primeira mostra e sentimos também que a marginAL aproximou esses realizadores, promoveu essa troca de experiências. São produtoras de grupos de amigos que atuam há mais de 10 anos nesse esquema e não tinham tanta interação.

Todos os filmes merecem destaque e têm suas particularidades, mas quero colocar aqui, principalmente, dois lançamentos que devem chamar mais a atenção do público pelo conteúdo e formato: o documentário marginAL, realizado por mim, Buzugo e João Marcelo (Sirva-se Filmes), que encerra um ciclo com a primeira edição, e o longa Zona Trash, da CH Trash Filmes, produtora de Olho D’Água das Flores.

O primeiro, por apresentar ao público esse tipo de produção a partir de entrevistas com alguns dos realizadores e de entusiastas do cinema no estado, além de como foi a primeira edição da mostra. O segundo, um filme de horror e suspense, com uma maquiagem engenhosa e um roteiro que envolve dois anos de produção e que vai ser exibido pela primeira vez em Maceió, depois de passar por algumas cidades do interior e ser notícia em vários portais do estado.

Serviço

Evento: Mostra marginAL
Datas: 18 e 25 de Setembro de 2015
Horário: A partir das 18h
Local: Centro Cultural Arte Pajuçara
Filmes do dia 18: Zumbification, 2015 (15 min. /Ganapati Pictures), marginAL, 2013 (18:06 min./Sirva-se Filmes), Não Entre, 2015 (05:30 min./Ganapati Pictures), Surf Kaeté, 2015 (37 min./Scoria Filmes), O Assaltado, 2015 (09:25 min./HD Filmes) e Sinopse, 2014 (06:42 min./Radicais Livres com o apoio do Sesc).
Filmes do dia 25: Zona Trash, 2014 (1h43/CH Trash Filmes), Reencarnação, 2014 (01 min./Estúdio Emanar) e Respostas, 2015 (07:16 min./Estúdio Emanar).

Por Rafhael Barbosa (Audiovisual Alagoas)

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