Texto: Raoni Sousa. Revisão: Chico Torres.
“Sem pressa. Sente. Vem aqui ver”. É assim que Natureza e Destino (2022), de Bruna Costa Leite, parece nos chamar silenciosamente a um percurso contemplativo de quatro minutos. Em tela, pouco movimento — mas sempre movimento, ainda que só de luzes, sombras, ângulos, ar ou mesmo da respiração ao se segurar a câmera. O filme respira. Não há pressa em seu movimento, mas quem tem pressa passa batido por ele.
Em meio a imagens de ambientes fechados e abertos em alternância, em que essa respiração se manifesta visualmente de várias maneiras (entrar e sair, concreto e vivo, (treme)luzir e apagar-se), uma imagem de Maria se apresenta. Um lance de luz — também sem pressa, porém curto e certeiro — nos revela seu choro de sangue, que, com o réquiem de Mozart ao fundo, imprime na respiração do filme uma tônica de memento mori. Esse respirar da obra nos envolve de maneira singular no tocante à tensão vida-morte, e a forma como se constrói esse envolvimento, sem verbalizar “é nosso destino morrer”, sinaliza um tecer criativo e cuidadoso.
Por sua vez, o signo “natureza” do título, por um lado já explorado no sentido de uma característica da vida (a mortalidade), é ainda trabalhado na acepção do que é justaposto (ou contraposto) ao humano-cultural. Vemos uma edificação em ruínas tomada por vegetação. Tal como morremos e a natureza nos come, o que construímos também morre e é devorado pela natureza. Podemos, a partir daí, refletir: quantos muros são erguidos como se, por sermos humanos, não fôssemos parte da natureza (e mortais)? E quão normalizado é construir paredes entre nós — inclusive deixando tantos sem abrigo fora delas — para “preservar a vida”, em vez de normalizar as partilhas? Natureza e Destino não nos empurra tais questões, tampouco conclusões; mas, para além da experiência contemplativa, nos apresenta uma margem para refletir sobre o que se supõe comumente ser uma fronteira clara entre natureza e humanidade, bem como as implicações práticas dessa suposição.
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