Perguntas: Larissa Lisboa e Roseane Monteiro. Respostas: Luísa Pécora.
É possível que você já tenha visto algum conteúdo criado pela Luísa Pécora compartilhado em nossa página do Facebook ou em nosso story no Instagram a partir do site “Mulher no Cinema“. Luísa é criadora do site, jornalista e editora. Foi pensando em quem pode ou não acompanhar o conteúdo compartilhado pelo “Mulher no Cinema”, site ou redes sociais, que pensamos em fazer e compartilhar essa entrevista.
Larissa Lisboa (que aqui escrevo) acompanha o “Mulher no Cinema” pelo Facebook desde 2016, mantendo-se informada sobre as estreias de filmes estrelados ou dirigidos por mulheres nas salas de cinema semanalmente, acessando também as notícias para conhecer mais um pouco sobre a presença, atuação e (re)existência das mulheres no cinema. Teve a oportunidade de conhecer Luísa pessoalmente e participar como ouvinte de uma aula da primeira edição do curso Mulheres no Cinema em junho, ministrado por Luísa Pécora e Joyce Pais no Instituto de Cinema em São Paulo.
Larissa Lisboa: Como foi o início da sua paixão pelo cinema?
Luísa Pécora: É difícil dizer ao certo, mas penso que ela começou na infância, estimulada por meu pai e meus irmãos. Lembro de ir ao cinema, mas principalmente de frequentar videolocadoras. Um momento muito marcante também foi quando assisti Cidade dos Sonhos, do David Lynch, aos 15 ou 16 anos, e senti como se tivesse vivido uma experiência cinematográfica diferente de todas as outras. Acho que foi a partir daí que minha cinefilia cresceu de forma mais consciente.
LL: Qual foi a primeira pesquisa/texto em cinema que você desenvolveu como jornalista?
LP: Não faço a mínima ideia! Em algum momento da faculdade eu criei um blog de cinema com amigos, no qual escrevia com frequência. Também fui monitora do site do curso de Jornalismo, e nessa função eu tanto ajudava outros alunos a desenvolver suas pautas como escrevia textos próprios. E depois, no terceiro ano, fiz estágio na revista Cult. Em algum desses momentos o primeiro texto sobre cinema deve ter aparecido.
LL: Como surgiu o Mulher no Cinema?
LP: A versão curta da história é que eu já me interessava sobre o tema há muitos anos e em 2015, quando ele começou a ganhar muita força (no Oscar, em Cannes, na imprensa, no Brasil…), achei que alguém tinha que criar um veículo em português sobre o assunto. Então fiz exatamente isso: em junho de 2015, criei o site que eu queria ler.
A versão longa é que em 2009 eu vi Guerra ao Terror, da Kathryn Bigelow, e comecei a ler muito sobre o filme e sobre ela. Na época a imprensa estrangeira publicou muitos textos sobre a mulher no cinema por causa das chances de ela concorrer ao Oscar de direção, o que era e segue sendo muito raro. Foi aí que eu comecei a pensar sobre o assunto, refletir sobre quem eram as minhas referências e ter uma postura ativa tanto em buscar mais filmes dirigidos por mulheres quanto em ler e pesquisar sobre o tema de forma geral. Na época eu não trabalhava com cinema, era repórter de Internacional, então o interesse foi pessoal antes de ser profissional. Anos depois, em 2013, quando aí sim eu já era repórter da área de cultura, fiz uma série de três reportagens sobre a mulher no cinema para o portal iG, onde eu trabalhava. Desta série eu tirei duas conclusões: a primeira foi que havia mais gente interessada no assunto, porque o retorno tinha sido bem legal; e a segunda foi que eu tinha de fazer alguma coisa maior sobre isso, embora não soubesse se deveria ser um livro, um mestrado, um blog etc. Pensava sempre também que a discussão no Brasil estava muito atrasada em relação ao exterior, e que seria importante existir um veículo que produzisse conteúdo sobre o tema em português e ajudasse a discussão a ter alcance. E aí chegamos à versão curta: em junho de 2015, criei o site que eu queria ler.
LL: Como é feita a gestão do projeto e quais os desafios?
LP: Acho que o maior desafio é dar conta de todos os aspectos do projeto, que vão desde pensar as pautas e produzir o conteúdo até buscar formas de viabilizá-lo financeiramente, passando por atualizar as redes sociais, ter contato com os leitores, participar de eventos e discussões, assistir a filmes…Tudo isso exige uma dedicação muito grande de tempo e de energia. O lado bom é que eu gosto muito do tema e de fazer a maior parte dessas coisas.
LL: Como foi realizar a primeira edição do curso “Mulher no cinema”? E qual a expectativa para a segunda edição?
LP: Foi uma experiência bem marcante e de muito aprendizado. Primeiro há o aprendizado que vem da própria preparação das aulas, tanto no processo de pesquisa quanto no processo de buscar a melhor forma de passar aos outros o conhecimento que você adquiriu. E depois há o aprendizado que acontece na sala de aula, na troca com os alunos, ouvindo, conversando. Percebi que eles levaram as nossas discussões a outras pessoas – pais, amigos, mulheres, maridos – e isso foi gratificante. Então a expectativa para a segunda edição é grande. Ouvindo o feedback dos alunos nós aumentamos o número de aulas e vamos conseguir falar de cada diretora com mais calma e ter mais tempo para debate.
LL: Como os agentes do audiovisual e o público podem colaborar com o site?
LP: O Mulher no Cinema tem uma campanha de financiamento recorrente no Apoia.se (http://apoia.se/mulhernocinema), que funciona como um sistema de assinaturas. Qualquer pessoa pode fazer colaborações mensais que começam em R$ 3 e ajudam o site a seguir no ar e a produzir cada vez mais conteúdo de qualidade. A partir de R$ 7 estas colaborações preveem acesso a conteúdo exclusivo, como newsletters e podcast. E eu também estou sempre aberta a parcerias, conversas e sugestões no contato@mulhernocinema.com
LL: Como apresentaria o cenário atual do cinema mundial e brasileiro, artisticamente e politicamente para uma mulher que deseja atuar no cinema?
LP: O cinema ainda é uma área muito desigual no que diz respeito a homens e mulheres – nas oportunidades, nos salários, nas relações de trabalho e até nos estereótipos sobre quais filmes uma mulher pode dirigir. No caso específico do Brasil, é um momento de incertezas, no qual muitas das políticas públicas de fomento ao audiovisual parecem ameaçadas – assim como as próprias iniciativas voltadas à igualdade de gênero e raça que vinham sendo criadas e implementadas pela Ancine. Ou seja, não é um cenário fácil. Ao mesmo tempo, a discussão sobre a mulher no cinema no Brasil aconteceu junto com a criação de coletivos, grupos, associações. Acho que essa ação coletiva pode ser muito importante nesse momento.
LL: Como avalia a participação das mulheres no cinema brasileiro?
LP: Como em outros lugares do mundo, o Brasil tem muitas mulheres atuando na produção – mais do que em outras funções criativas, como roteiro e direção. O percentual de diretoras cresceu desde a retomada, mas ainda fica em torno de 20%, o que é muito pouco. Uma questão fundamental para o cinema brasileiro é fomentar a participação das mulheres negras, um grupo que é muito pouco representado – atrás não apenas dos homens brancos como das mulheres brancas e dos homens negros. O cinema brasileiro se beneficiou muito das políticas públicas que fomentaram a produção fora do eixo Rio-São Paulo, permitindo que histórias, paisagens e talentos de outras regiões chegassem às telas. Penso que o mesmo aconteceria com o fomento à diversidade de gênero e raça entre os realizadores.
Roseane Monteiro: Os filmes de horror e terror hollywoodiano têm a predominância masculina tanto na escrita do Roteiro quanto na Direção, o que você destaca nos últimos anos no Brasil de trabalhos expressivos de mulheres que seguem esse gênero cinematográfico?
LP: Posso dizer que eu mesma revi muitas das opiniões e preconceitos que tinha em relação ao cinema de horror graças ao trabalho de duas diretoras brasileiras: Juliana Rojas e Gabriela Amaral Almeida. Nunca fui uma grande conhecedora do gênero e em geral pensava nesses filmes como pouco profundos. Mas os curtas e longas da Juliana e da Gabriela dizem muito sobre as emoções humanas e a sociedade brasileira, e me fizeram olhar para o horror com outros olhos.
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Luísa Pécora é jornalista e criadora do Mulher no Cinema, site exclusivamente dedicado a filmes realizados ou estrelados por mulheres. Participou de press junkets e festivais de cinema no Brasil, Estados Unidos, Inglaterra e México. Foi editora do catálogo da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (2015) e responsável pela cobertura nas redes sociais do Festival Internacional de Mulheres no Cinema (2018), além de ministrar cursos e palestras e atuar como curadora e jurada de mostras e festivais. Trabalhou no portal iG e na revista Cult e colaborou para publicações como Gol, Playboy, Filme B, Modefica e FilmMaker. Integra o Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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