Texto: Janderson Felipe. Revisão: Larissa Lisboa.
Difícil dizer que existiu um tema central que alinha todos os filmes do segundo dia da mostra competitiva da IX Mostra Sururu de Cinema Alagoano, mas pode-se dizer que a curadoria pensou a começar com Um Fato, Várias Lentes: 17 de Julho e terminar com Besta Fera, a sessão se propôs a discorrer sobre a história antes não contada de Alagoas, enquanto com Coração Sem Freio, Estigma e Tipóia entrelaçam as dores dos sonhos, mente e corpo.
Um Fato, Várias Lentes: 17 de Julho (Dir. Bruno Fernandes e Camila Costa)
Interessante ver que um filme que busca valorizar a profissão do fotojornalista use tão pouco do material imagético desses profissionais, enquanto as fotos desses fotógrafos passam praticamente como flashes vemos muito mais a entrevista de cabeça falante, a questão é que essa troca de valorizar a palavra desses homens ao invés das imagens, não dá impulsão necessária e até rítmica para o filme como um momento em que todos falam basicamente a mesma coisa sobre a relação entre texto e imagem no jornalismo, mas o filme em contraposição mostra que a potência do fotojornalismo está na ação como o ótimo momento onde cada um reconstitui as fotos de 21 anos atrás, a sensação que fica é de querer ver mais essas imagens e a condição de fotojornalista em ação.
Coração Sem Freio (Dir. Cris da Silva e Hallana Lamenha)
A adolescência é tão popularmente conhecida por ser intensa, irritadiça e transgressora que tipos de filmes sairiam se dessem vazão a essas emoções, câmera e microfone nas mãos desses adolescentes? Uma das possíveis respostas estão em Coração Sem Freio, fruto de oficina com alunos de uma escola no Salvador Lyra, bairro periférico de Maceió, é do marasmo de Débora na escola quebrado por uma bolada e uma paixão, que caímos nos seus sonhos românticos. E por mais que pareça brega e desconjuntado, cada sonho e cada dialogo, eles também são honestos, são verdadeiros, porque são sonhos adolescentes que estão além da busca de se enquadrar em alguma gramatica padronizada e clássica do cinema, assim nasce esse cinema que é intenso e desobediente, aqui se respira e vivencia cinema. Por mais corações sem freio.
Estigma (Dir. Gabriela Araújo dos Santos)
A condição de hospitais psiquiátricos é pauta há mais de 20 anos no Brasil, e Estigma se torna valoroso ao trazer essa discussão para Alagoas, principalmente por dar voz aqueles que vivem e dependem desse sistema, apesar de estar preso ainda a uma estrutura engessada em capítulos que marcam em presente, passado e futuro e pela fala institucional da especialista, é interessante ver que o filme abre espaço para as contradições entre pacientes e psiquiatra, e é justamente nos pacientes que se encontra a força do filme, como o caso da radialista que hoje é impedida pela marido de exercer a profissão ou do jovem que quer sair e estudar para ser psicólogo, é nos sonhos e planos dessas pessoas que o filme se encontra e encanta.
Tipoia (Dir. Paulo Silver)
Ao fim de Tipoia dá pra se pensar que esse junto dos dois filmes anteriores de Paulo Silver, Retina e Eu Me Preocupo, Paulo fez um raio-x sobre si mesmo e as pessoas que compartilha sua vida, pai, mãe e amigos. Desta trilogia que é sobre Paulo, cinema, as suas memórias, as pessoas em sua volta, Tipoia é o que se apresenta como mais sombrio, é onde se apresenta a quebra em corpo e mente que estão aprisionados num apartamento obrigado a assistir aulas de meditação e a situação política brasileira ruir, numa claustrofobia do homem impotente que está lutando para manter alguma luz acesa.
Besta Fera (Dir. Wagno Godez)
O filme de Wagno Godez começa com peso a partir da fotografia e forte presença de seu protagonista, aliás a atuações de Filipe Rios (Mariano) e Marcia Mariah (Flora), preenchem a tela com tamanha força que torna crível o drama daqueles dois personaens, a margem em pleno século XIX no sertão, mesmo que o trabalho de direção de arte não dê conta de entregar uma total verossimilhança da época e região, em que a tudo ali está em volta de algo muito limpo pra época, quase higienizante, onde a dureza emprestada pelos atores não é sentida no corpo, rosto e vestimenta dessas pessoas. O filme costura uma narrativa de criação de expectativa a partir das vontades de Mariano que quer mudar de vida e é impulsionado pela presença do homem que deu ajuda, para a entrega de um desfecho que se entrega as saídas mais fáceis.
Hoje, sábado (15), a IX Mostra Sururu de Cinema Alagoano continua às 18:00.
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