Cobertura: Mostra Sururu de Cinema Alagoano – 2º dia

Texto: Céuva. Revisão: Larissa Lisboa.

Fomos convidades a navegar em águas turbulentas de crítica, fantasia e fritação. No dia 13 de dezembro, a Sessão Maré exibiu com seis filmes as reverberações inquietantes da memória. Escafandro trouxe o cinema tradicional alagoano ao centro do olhar com narrativas que ambientam essa trajetória a partir de um necessário repertório, já Maré viaja a partir deste cabedal e estabelece sem muitas voltas a realidade, a estranha sensação de estarmos assistindo ao presente, inevitavelmente atravessado, rompido, despixelado. 

O contraste entre as obras exibidas em cada sessão é notório, a medida em que a tradição alagoana conta sobre a memória se valendo do mecanismo documental no fazer, em termos de enquadramento, escolha dos planos e montagem, a Sessão Maré apresenta uma vasta possibilidade de experimentações das ferramentas do cinema em termos de fotografia, som, montagem e gênero. Desde a janela 4:3 de Entre Corpos e a sensação de planificação que o P&B traz de forma muito inteligente, aos efeitos da pós enquanto elementos narrativos de Cavaram Uma Cova no Meu Coração que recriam um imaginário inteiro ao documentar o crime da Braskem, e Alerta Verde, uma animação tão necessária monas, que satiriza a criminalização da maconha e ainda faz o bozo de chacota. O presente talvez seja o melhor lugar para estarmos então, a Maré trouxe potências.

Entre Corpos dirigido por Mayra Costa, se pergunta, como seria o toque visceral da sublimação do desejo numa corpa mulher corrompida? Vânia, uma mulher ferramenta à serviço da vida. O vazio opera no intuito de ampliar a sensação que os planos médios recorrentes afirmam, a busca no corpo violado e a descrença no homem, o agressor que de corpo em corpo ela pune. Uma ficção que segundo Mayra é cruel, e acrescento, inesperadamente avassaladora, simples, sutil, e mortal.

Alagadiça advoga pela incomercializável memória da cultura periférica, como manifesto e prece. Pela direção de Felipe Graber, Bia Perman e Ariane Monteiro, o curta experimental orquestra o Slam por terras alagoanas convocando os frutos e brotos de suas reivindicações  frente a insustentável tentativa necropolítica de extermínio. Nas vozes babilônicas de Itailane Macena, Gustavo Cabral, João Julião da Silva e Levi Castro, ouvimos o semear da linguagem jorrar, nós cobraremos. A história permanece em raiz.

Mulheres brincantes que fazem da voz a palavra que canta e dança. Menina se Quere Vamo, dirigido por Juliana Barreto e Nicolle Freire, vangloria as passagens das Mestras do Coco e mostra suas descendentes na reivindicação política do espaço, o protagonismo feminino interseccional monta uma trajetória de afeto, histórias e reafirmações. Um filme dedicado a todas as mulheres brincantes que fazem da arte sua expressão. 

HX95, um vírus que não ataca maconheires. Rolou um atentado terrorista babado, que só Roberto sobrevive, isso tudo porque ele depravou um fino antes de arrumar a casa. A animação Alerta Verde, que ganhou o público da 15ª Mostra Sururu, dirigida por João Paulo Procópio, se faz sarcástica à medida que sublinha um teor político em situação absurdamente cômicas sobre o cotidiano, à medida que o filme se desapropria do que acontece em si, ele reforça o ridículo na inteligência policial totalmente hipócrita, frente a legalização necessária. A mensagem está dada dives, barbarizem seus becks. 

Seus Lábios pela direção de Leonardo Amorim, uma sáfica bruxona obcecada. Terrivelmente fadada ao desejo suspiro, clama pelo mel salgado num frígido tesão aparentemente abundante, e se entope até o pescoço com a ilusão do amor dos sonhos preso a tantas decisões trágicas. A pós do som, a fotografia, e a arte entregaram tudo na ambientação do fantástico, um gritante motriz que movimenta o roteiro, as sáficas são os elementos reféns que dão o tesão cuir.

O eco das vozes que não estão mais na igreja, é o mesmo das vidas perdidas, afetadas e agredidas pela Braskem. Um híbrido dirigido por Ulisses Arthur (Cavaram Uma Cova no Meu Coração), com uma gangue de adolescentes que travam a batalha da vida contra as máquinas que invadiram e destruíram seus lares, os vazios nas ruínas que consomem o espaço , o corpo e a identidade dos moradores, e o sentimento de revolta guardado no coração de crianças e adolescentes que querem justiça. Um filme que denuncia pela imagem, queima a Braskem e assegura a eternidade das emoções, trajetórias e esperanças que residem no território e em nós porque Cavaram Uma Cova no Meu Coração.

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