Crítica: O Branco da Raiz (dir. Anderson Barbosa)

Texto: Jasmelino de Paiva. Revisão: Tatiana Magalhães.

As Texturas do Branco,

A profundidade das composições visuais no curta-metragem O Branco da Raiz, exibido no terceiro dia da Mostra Sururu deste ano, emocionaram-me imensamente. Arrisco dizer que todos os planos foram tão bem pensados que, se congelarmos o filme em qualquer momento, estaremos diante de uma belíssima fotografia. A decisão de filmar em preto e branco não poderia ter sido mais acertada. É encantador como a fotógrafa Rita Moura soube trabalhar os contrastes, as texturas e o céu.

Como assistimos a um filme em preto em branco, as cores dão lugar aos contrates, numa espécie de jogo entre a luz e a sombra. Tudo sempre está em foco e há algo movimentando-se no plano, me remetendo à estética do cinema oriental e aos filmes de Akira Kurosawa. Se repararmos bem, notaremos que em algum lugar na escala de cinza, a farinha, as mãos que trabalham nela, a folhagem das plantações de mandioca, os cestos de palha, a madeira das carroças e as enxadas, tornam-se texturas e formas, que se entrelaçam no movimento sempre presente nas cenas. É esse movimento que dá ritmo à narrativa. O orgânico sobrepõe-se ao artificial. A farinha à madeira. O céu à pele. A folha à terra.

A fotografia do documentário tem tamanha potência que toca com delicadeza cada um dos nossos sentidos enquanto a vemos passar. Um mérito também do desenho de som, que, de igual modo, cuida de envolver os ouvidos, optando por amplificar os sons do ambiente como forma de nos aproximar ainda mais do que estamos vendo. A trilha sonora escolhida nos guiou com carinho pelas paisagens do interior, fazendo um pouco de falta senti-la mais próxima de nós.

A experiência, no entanto, acaba perdendo um pouco de sua magia quando escutamos os depoimentos em off dos personagens. Baixamos, literalmente, à terra. Nesses momentos, o filme perde a intensidade, descendo de uma atmosfera experimental e imagética para uma documental e etnográfica, o que também é ótimo, mas nos distancia do estado que vinha nos inserindo e traz informações que já estavam ali. Tenho a impressão de que, caso fossem suprimidos esses depoimentos e tivéssemos acompanhado conversas espontâneas desses personagens, o filme ganharia mais alma, e nos tornaríamos mais íntimos da família e desse universo, sem a necessidade de apresentações.

O Branco da Raiz poderia ser um desses filmes que se apoiam exclusivamente no poder de suas imagens, tamanha a força delas, não fosse a poesia que consegue captar quando se unem todos os elementos que o compõe. Vai além de uma experiência sensorial, é uma homenagem aos seus personagens e à cultura das casas de farinha. O curta é sobre a poesia que se embrenha em nossos interiores e resultado da sensibilidade dos olhares de nossos artistas. Daí minha emoção e a razão de meu sentimentalismo.

Sobre Jasmelino de Paiva
Graduado em Direito pela Universidade Federal de Alagoas, atuou como advogado de 2014 até o final de 2017. Durante o ano de 2018, formou-se como técnico em direção de fotografia e câmera pela Fundación ECA – Escuela Cinematográfica Argentina, na cidade de Buenos Aires, onde desenvolveu trabalhos em várias áreas da produção cinematográfica, e em especial, na área de fotografia e arte. Na mesma fundação, cursou direção de arte. No decorrer do curso técnico de direção de fotografia e câmera, teve a oportunidade de escrever e dirigir o mine- metragem "Ausência", produzido pela própria escola. Ainda em Buenos Aires, foi diretor de arte no curta-metragem "Espacio Tiempo", de Matias Idaberry, também trabalhando como assistente de direção no curta-metragem de ficção "Soldade", de Marcela Mascarenhas, atualmente em etapa de finalização. Como assistente de arte, trabalhou em alguns episódios da websérie "El Busca del Gorrión Rojo". Em 2019, atuou como assistente de direção no curta- metragem documental "Pedro Pedreiro", de Glauber Xavier, projeto contemplado no Prêmio de Incentivo à Produção Audiovisual de Alagoas, que se encontra em pós-produção.

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