Crítica: Samuel foi Trabalhar (dir. Janderson Felipe e Lucas Litrento)

Texto: Laura Gomes

A prisão silenciosa do trabalho

No curta-metragem Samuel foi Trabalhar, de Janderson Felipe e Lucas Litrento, a história é simples, mas intensa, revelando com clareza os dilemas existenciais de um jovem que busca seu lugar em um sistema que parece querer apagá-lo. 

Desde a primeira cena, em que Samuel aparece fantasiado de mascote da Zardana Imóveis, o filme nos coloca em um lugar desconfortável. A cena, simples e direta, já nos provoca com o contraste entre a fantasia e a paisagem da praia, gerando uma sensação de alienação. 

Aqui, entendemos a alienação como o modo pelo qual Samuel passa a enxergar aquele trabalho como a única possibilidade de mudar sua vida. Esse sentimento é impulsionado, principalmente, pelo medo de perder mais um emprego e pelas poucas oportunidades que teve ao longo da vida. Em contraste, Edilene, sua colega de trabalho e potencial par romântico, vê aquela situação apenas como um ‘bico’, algo temporário, sem perspectiva de futuro. 

Esse sentimento de desconexão se aprofunda quando a fantasia parece ganhar vida própria, tornando-se quase uma extensão do próprio Samuel, mostrando como o trabalho — e as exigências dele — invadem até os momentos mais íntimos de sua vida. 

A estética de Samuel Foi Trabalhar cumpre sua função ao refletir a angústia do protagonista. O filme mistura cenas do cotidiano com devaneios surreais e experimenta uma transição de gêneros, como na sequência de suspense em que Samuel parece ser perseguido pela comunidade onde mora. 

Nesta cena, ele se depara com colagens do boneco da Zardana Imóveis e com a frase ‘Eterno Samuel’ pichada em um muro, apenas para, em seguida, perceber que tudo não passava de um sonho. 

Além disso, o curta se destaca por tocar na questão das relações humanas. Ele nos mostra momentos de leveza e solidariedade, como em conversas entre amigos ou no simples gesto de dividir a comida no trabalho. Momentos esses que servem como um contraponto necessário ao ambiente opressor em que Samuel se encontra. 

São nessas brechas de humanidade que o filme demonstra sua força emocional, ressaltando como mesmo em meio ao isolamento e à luta constante, ainda podemos encontrar consolo nas conexões genuínas uns com os outros. 

No fim das contas, Samuel foi Trabalhar não é apenas um retrato da precarização do trabalho, mas um alerta sobre como a identidade do trabalhador é moldada por um sistema que o consome. Mais do que uma crítica social, o filme é um convite à empatia, lembrando-nos que, na luta silenciosa de Samuel, vemos um reflexo de todos nós, vivendo em um mundo que exige mais do que podemos dar.

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