Cobertura: 10ª Mostra Sururu de Cinema Alagoano – 3º dia

Revisão: Fabbio Cassiano e Larissa Lisboa.

O terceiro dia da Mostra Sururu de Cinema Alagoano teve como marca predominante os documentários. A diversidade temática e de paisagens interioranas apresentada nesses filmes foram registradas em preto e branco e em colorido. A saturação e o contraste foram a potência desse dia. Destaca-se também o olhar voltado para a cultura alagoana em seu sentido antropológico, ou seja, tanto nos hábitos, quanto nos costumes e práticas. Absorvemos essa Alagoas múltipla pela perspectiva dos realizadores: as rezadeiras, um senhor das coisas, um músico alagoano, um catador/cantor e um pescador/trovador e a produção da farinha de mandioca.

As paisagens do sertão, do agreste e do litoral são respiros e pontos curiosos para tentar entender essas contradições que compõem Alagoas.

De Água E De Reza (dir. Rodrigo Barros Gewehr)

Este curta é centralizado nos depoimentos de três benzedeiras de Água Branca, com o intuito de um registro cru e centrado no saber popular dessas mulheres. A prática de benzer advém da cultura popular que está intrínseca a religiosidade e se encontra ameaçada pela falta de interesse e escolhas pessoais por “melhorias” de vida. O filme não explora e nem insere imageticamente o espaço, as plantas, as ervas, as paisagens e mistérios do sertão. Um fator para ser ressaltado é o excesso de zoom in e zoom out no meio das entrevistas que prejudicou a imersão ao filme. O cinema produzido em Alagoas vem se aprofundando no universo das benzedeiras e das plantas medicinais, como ocorre em Ponto das Ervas (1978) de Celso Brandão e Angelita (2016) de Jéssica Conceição e Mare Gomes. Acreditamos que De Água E De Reza contribui para a memória dessa prática, mas também poderia ter aprofundado mais nesse universo.

O Homem Das Coisas (dir. coletiva)

É um documentário que retrata Seu Edvaldo e sua mania de colecionar. Sua casa tem coleções de discos, cactos e peixes, e por isso os diretores exploram planos detalhes dos objetos do protagonista. A obra consegue mostrar a desordem e ordem na casa do colecionador assim como os desejos de Seu Edvaldo. O documentário é um gênero do cinema que trabalha muito bem com os imprevistos e com a pesquisa, por isso, o curta acerta ao tentar procurar o que falta ao homem que tem “tudo”.

Tambor Ou Bola (dir. Sérgio Onofre)

O filme foca na vida do músico Wilson Santos desde sua infância até galgar o sucesso na música alagoana. Wilson é negro e morador dos bairros da Ponta Grossa e do Vergel do Lago, sua história é rica. Ao utilizar tanto o depoimento do protagonista e intercalar com recurso de docudrama para encenar parte do discurso do músico, o filme se perde no seu próprio roteiro. Entretanto, a parte técnica do filme como fotografia e trilha, e a história de Wilson auxiliam na identificação do público.

Caminhando e Cantando (dir. Júlia Maria)

Quantas histórias guardam as pessoas em sua volta? E as pessoas que você encontra no seu bairro? As que ficam nas vendinhas da esquina, na padaria ou os andarilhos? O filme de Júlia Maria é feito de vontade e pelo desejo de registrar, assim como, tem o olhar voltado para quem estar à margem. O curta de pouco recurso técnico procura mostrar para os espectadores quem é Francisco. Em sua jornada de trabalho, o catador de recicláveis canta pela cidade, solta sua voz para ser ouvido. Felizmente, Júlia Maria estava lá.

O Poeta do Barro Vermelho (dir. Matheus Nobre)

O curta-metragem tem um narrador/trovador que nos conta as origens da cidade de Penedo e sua atual situação em relação às transformações do rio São Francisco. A animação didaticamente nos mostra essas conexões, com tom leve e ao mesmo tempo busca a reflexão de quem o assiste. Ressalto o belo plano geral do rio banhando a cidade de Penedo, mostrando o colorido e os traços detalhados do conjunto arquitetônico do lugar.

O Branco da Raiz (dir. Anderson Barbosa)

Esse documentário fechou a sessão do terceiro dia da Mostra, com uma perspectiva contemplativa, intimista e silenciosa do fazer da farinha de mandioca. A obra apresenta uma família do município de Limoeiro de Anadia e os seus saberes. O filme dialoga com as prática de benzer as pessoas, como algo que está na eminência de desaparecer da nossa cultura. Busca através de uma bela fotografia em preto e branco guardar no substrato da memória todo o processo: desde o plantar a macaxeira/mandioca à torrar a farinha. O filme é conceituado nesse saber de longa duração, de outro tempo, com tomadas mais longas e sem tantos diálogos, é dessa forma que a narrativa se estrutura, todavia, essa experiência foi interrompida com a cena da igreja, pois nesse momento a cantoria e as orações quebram o ambiente introspectivo edificado pela narrativa, gerando dessa modo, um anticlímax.

Be the first to comment

Leave a Reply

Seu e-mail não será divulgado


*