Crítica: Sargaço (dir. Yuri Melo)

Texto: Cícero Rogério do Nascimento. Revisão: Tati Magalhães

Na tela, o contraste e a incerteza em enquadramentos de arrepiar

Foi tudo filmado de um celular, mas as cenas não deixam nada a dever para produções com mais recursos financeiros. Dois enquadramentos chamam a atenção: Léo está encostado na coluna de concreto do emissário submarino, de onde o esgoto da cidade enche o mar de sujeira tratada, ao mesmo tempo em que se vê ao fundo da imagem crianças jogando bola na beira da praia e uma garota se aproximando, querendo aconchego.

Bia, em super close, fuma com o mar à distância, seu corpo treme, embora só vejamos seu perfil inclinado, cujo nariz e o cigarro apontam para a praia. A sensação é de desconforto, insegurança, medo.

Embora saibamos que nossa existência é finita, sendo uma das poucas certezas que temos como humanos, acreditamos que o nosso caminhar no mundo é duradouro, porque sabemos que o tempo, mesmo correndo, nos traz a possibilidade de construir relacionamentos e interagir com o que está ao nosso redor, incluindo as pessoas e a natureza.

O que a cidade nos oferece? Praia, sol e mar são suficientes para encarar a vida, que pode durar apenas meses ou alguns anos, mesmo para quem tem toda uma existência pela frente, já que se é muito jovem?
Para Léo e Bia, o tempo de estar junto é vivido em poucos instantes a caminho e dentro do mar. Apenas isso, o que dependendo do ponto de vista, já pode ser o suficiente.

“Sargaço” é um filme de contrastes, conflitos e incertezas, numa direção de fotografia premiada pelo júri oficial da 14ª Mostra Sururu de Cinema Alagoano. A premiação não poderia ser diferente, principalmente com o equipamento de filmagem que foi utilizado, o que demonstra que a criatividade está acima de recursos financeiros e tecnológicos, embora ambos sejam muito importantes para a realização de qualquer tipo de cinema.

As imagens e o roteiro carregam consigo essa incerteza de permanecer na cidade ou se ausentar dela, de continuar ou terminar uma relação, de fazer cinema, ou largar tudo para seguir uma carreira estável, mesmo sabendo de todas as dificuldades de realização da sétima arte, no lugar que é ou já foi o paraíso das águas.

Não é um filme para turista ver, embora eu o recomende para qualquer visitante, porque a cidade que se apresenta na tela é a metáfora da incerteza e dos contrastes vividos por Léo e Bia.

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