Série Lugares de Atuação, uma entrevista com Ane Oliva

Perguntas e revisão: Karina Liliane e Larissa Lisboa. Respostas e foto: Ane Oliva. Ilustrações: Weber Salles Bagetti.

Guiadas pelo desejo de dar continuidade ao diálogo sobre lugares de atuação em Alagoas, Karina Liliane e Larissa Lisboa elaboraram esta série de entrevistas que nesta primeira rodada foi criada junto aos atores e atrizes alagoanos Julien Costa, Silvio Leal, Wanderlândia Melo, Ane Oliva e Laís Lira. Cada entrevistadx foi estimuladx a falar dos seus lugares de atuação, Ane Oliva compartilha sobre suas experiências nas artes cênicas (teatro, performance, danças, etc) e no cinema. Ela compõe o elenco dos filmes alagoanos Desalmada e atrevida (dir. Pedro da Rocha), Um vestido para Lia (dir. Hermano Figueiredo e Regina Barbosa), Maré Viva (dir. Alice Jardim) e A Barca (dir. Nilton Resende).

Larissa Lisboa: Qual foi o seu primeiro contato com a atuação no Teatro como espectador? E no cinema?

Como espectadora… bem, no Teatro, foi assistindo a peça Uma canção de Guerreiro no Chumbrego da Orgia, do grupo Joana Gajuru, em 1995. No ano seguinte, eu entrei para o grupo onde permaneci por 15 anos. Essa foi a primeira peça que assisti, mas antes disso, eu já tivera minha primeira experiência como atriz: quando aos 8 anos eu interpretei o personagem “Burro” no clássico O boi e o burro à caminho de Belém da Maria Clara Machado. Foi nessa ocasião que soube que queria ser atriz.

No cinema, o meu primeiro contato com atuação, foi no filme Ghost: do outro lado da vida, e a interpretação brilhante de Whoopi Goldberg, Demi Moore e Patrick Swayze. Óbvio que assisti outros filmes antes desse, especialmente os filmes da “Sessão da Tarde”, que era o canal em que tinha acesso ao cinema. Mas o Ghost, me marcou, pois foi a primeira vez que fui a uma sala de cinema. Nunca esqueci. Alguns filmes que me marcaram antes da experiência de ir à uma sala de cinema: E o Vento Levou, e a inesquecível atuação de Vivien Leigh; A Noviça Rebelde, e a maravilhosa Julie Andrews, Nos Tempos da Brilhantina (amo filmes com dança). Amava os filmes do John Travolta.

LL e Karina Liliane: Qual a sua primeira lembrança atuando? (onde e quando)

A minha primeira experiência como atriz, foi na escola, quando aos 8 anos de idade, interpretei o “Burro”, do clássico O Boi e o Burro à caminho de Belém, da Maria Clara Machado. Foi quando soube que queria ser atriz. Mas a certeza que seria essa minha profissão veio quando participei do espetáculo Canção de Fogo, no Curso de Formação do Ator, da UFAL, em 1995.

KL: Você acredita que esse momento teve influência sob o caminho que percorreu na escolha da atuação como profissão e como lugar de expressão máxima do seu fazer artístico? 

Com toda certeza!!!! Desde essa experiência na peça da escola, passei a desejar ser atriz! A partir daí, todas as minhas ações, eram voltadas pra que eu conseguisse seguir a carreira de atriz.

KL: Qual e onde foi o seu primeiro trabalho a partir do momento em que entendeu a atuação como profissão? Ou qual trabalho te fez enxergar como uma profissão?

Foi quando ingressei para a Associação Teatral Joana Gajuru, em 1996. Até então as experiências em atuação foram como aluna do curso da Ufal.  Fiquei nessa companhia por 15 anos, onde atuei em diversos espetáculos de teatro de rua e de palco, participei de Festivais de Teatro em vários Estados do país, recebi meus primeiros cachês.

Ilustração: Weber Salles Bagetti

LL: Como teve início o seu diálogo com o cinema alagoano?

Nossa, algumas lembranças! Minha primeira experiência efetiva num set, foi em um filme do professor da Ufal, Joaquim Alves. Ele filmava nas dependências do Espaço Cultural da Ufal. Um filme, que não me lembro o título e que nunca foi finalizado! Mas me recordo de como era prazeroso o clima das gravações. Vários alunos do curso. Era, se não me engano, um filme de terror! (rsrsrsrsr).

Depois dessa experiência, e de ter feito vários testes para filmes de produção de outros Estados, tive então minha primeira real participação numa produção cinematográfica alagoana. Foi no filme do diretor Pedro da Rocha Desalmada e Atrevida. Foi maravilhoso. No set, estive com vários amigos com quem trabalhei no teatro, em um clima de muita alegria, descontração, o que me ajudou, pois achava muito difícil a relação com a câmera. Até então tinha um certo receio de nunca fazer cinema! Afinal, eu vinha do teatro de rua. Eu tinha pelo cinema a mesma impressão de frieza que sentia com produções publicitárias. Achava frio dialogar com aquela câmera. E por essa dificuldade, achava que nunca conseguiria fazer cinema. Mas a leveza e a forma como foi conduzida a filmagem pelo Pedrinho e a Vera, e os meus colegas no set, aos poucos foi derrubando essa barreira!

Depois dessa experiência, fiz o filme da Regina Barbosa e do Hermano Figueiredo, Um vestido para Lia, onde já me sentia muito mais a vontade no set. Outra experiência marcante e que me deixou muito honrada!!!!

KL: O que poderia descrever como singular de cada local de atuação e/ou quais diferenças enxerga no fazer artístico quando aplicado em locais distintos?

Pra mim o que é mais singular na atuação no teatro, é a relação de resposta com o público! A resposta ao trabalho de criação da personagem e sua relação com a plateia é imediata. O feedback é instantâneo. A comunicação se faz no momento da cena. O choro, o riso, o aplauso, a sensação de suspensão no ar, retornam para o ator e lhe diz como o espectador recebeu a atuação. Já no cinema, essa resposta virá muito tempo depois, quando o filme for exibido, o que pode levar às vezes anos depois da gravação.

Outra singularidade que diferencia o cinema do teatro é a composição compartilhada da cena e que interfere ou reescreve o trabalho de atuação. Digo compartilhada, visto que o olhar e a atuação de outros profissionais do set e no pós set, reescrevem e direcionam o trabalho do ator/atriz. Em especial a participação do diretor, conduzindo a cena, juntamente, com o diretor de fotografia, capturando a imagem e as entonações que melhor ajudarão a contar a história. E posteriormente, a figura do montador, finalizando essa história.

Outra situação a ser apontada e que pra mim é uma das coisas mais difíceis no trabalho do ator, no cinema, é a fragmentação do trabalho de atuação. No teatro, o “aqui, agora” da cena, obriga uma interpretação contínua! Entrou no palco, é você, seu personagem, a cena e o público respondendo. No set de cinema, os vários takes, os diversos planos, acabam fragmentando o trabalho do ator. E muitas vezes, segurar e manter, emoções, sensações, é muito mais difícil. Lidar com a repetição de “Corta!” e “Ação!”, é um exercício bem difícil, mas ao mesmo tempo, instigante.

Ilustração: Weber Salles Bagetti

LL: Como você vê a relação entre os lugares de atuação em Alagoas?

Acho que nos últimos anos, os lugares de atuação em Alagoas vêm passando por situações, bem distintas!

Sou de uma época e de um grupo de artistas da cena, já considerado “veterano”. Sou da época em que ocupar o espaço da rua como palco teatral era uma necessidade de se ter um espaço pra fazer teatro em Maceió. E por coincidência, da época em que o que se produzia de cinema no Estado, era fruto de produções de outros Estados, e que o espaço dado à atriz ou ator alagoanos era uma espécie de “cala a boca” diante dos incentivos que essas produções conseguiam dos órgãos públicos do Estado.

Hoje, fruto da luta e da insistência de muitos artistas do teatro e do audiovisual, os caminhos e espaços são outros. Vejo o cinema alagoano se abrindo e acreditando no ator e na atriz de Alagoas, e em contrapartida, vejo esse mesmo ator e essa mesma atriz, buscando entender essa linguagem, estudando, se engajando para ocupar esse lugar de atuação.

Outra coisa que me chama bastante atenção, é que hoje, o ator e a atriz, tem buscado interagir com outras linguagens artísticas: a música, o circo, a dança, a poesia. E acredito que isso nos ajuda a construir em nosso corpo, uma presença física, emocional, necessária na criação de personagens, seja no cinema, seja no teatro.

LL: Quais as dificuldades em trabalhar com atuação em Alagoas?

Basicamente, dificuldades de ordem financeira! E isso não apenas em Alagoas. A dificuldade é a mesma de sempre. Viver, pagar as contas, dedicar-se exclusivamente à atuação ainda é um sonho. Lutamos para fazer, aos trancos e barrancos, dividindo nosso tempo, com outras ocupações.

Parece às vezes utopia, trabalhar e se manter apenas com arte. E isso não é um privilégio nosso!

Os tempos atuais de governo como o de Bolsonaro, tem tornado ainda mais difícil essa realidade! Pois estamos diante de um governo que nega a cultura e a arte como campos de desenvolvimento da sociedade. E o artista ocupa neste governo um lugar de criminalidade e “vagabundagem”.

KL: Quais as expectativas/desejos/vontades que você tem em relação a sua profissão e aos campos de/para atuação em Alagoas nos/para os próximos anos? 

Confesso que tenho poucas expectativas para o setor cultural, como um todo, para os próximos anos. Muito do que construímos e conquistamos nas últimas décadas, estão sendo destruídos vertiginosamente! Acredito que a escassez de investimentos e políticas públicas para cultura, deixará o segmento em situações muito difíceis, com poucas produções, e o mercado de trabalho para artistas ainda mais fragilizado.

Mas como o artista é um sonhador por natureza, e um lutador por necessidade, continuaremos resistindo e  buscando reconquistar novos espaços de experimentação e atuação artística, sejam eles no cinema, no teatro, na música, ou qualquer outra linguagem!

Deixe a sua minibio aqui.

Sou atriz, formada pelo Curso de Formação do Ator, da UFAL, graduada em Ciências Sociais e Pedagogia. Durante 15 anos integrei o elenco do Grupo Teatral Joana Gajuru, atuando como atriz e produtora em diversos espetáculos da Companhia, a exemplo de Uma Canção de Guerreiro no Chumbrego da Orgia (1996), A Farinhada (1997), Olé, Olé, Gajuru o Guerreiro é Você (1998), Severino Gajuru (2001), A Estória da Moça Preguiçosa (2000), Fome Come (2003), A Farsa do Casamento Coisado (2007) e Baldroca (2009). Integrei também o elenco da Cia dos Pés, atuando nos espetáculos Yerma Maria da Silva, Encontros e Poéticas da Cidade.

Atualmente, sou atriz e produtora da Cia de Teatro LaCasa.

No cinema, atuei nas seguintes produções:

  • Mulheres do Brasil (Longa-metragem / 2006) – Direção: Malu de Martino/RJ – Figuração: MULHER RENDEIRA;
  • Desalmada e atrevida (Curta-metragem / 2007) – Direção: Pedro da Rocha/AL – Personagem: CHARLENE;
  • Um vestido para Lia (Curta-metragem / 2011) – Direção: Regina Barbosa/AL – Personagem: ZEFA;
  • Serial Kelly, (Longa-metragem gravado em 2017 – em fase de pós-produção) – Direção: René Guerra/AL  – Personagem: WELLANY;
  • Propriedade Privada, (Longa-metragem gravado em 2018 – em fase de pós-produção) Direção: Daniel Bandeira/PE – Personagem: SANDRA;
  • O Curral, (Longa-metragem gravado em 2018 – em fase de pós-produção) – Direção: Marcelo Brennand/PE – Persoangem: SILMARA
  • A Barca, (Curta-metragem / 2019) – Direção: Nilton Resende/AL – Personagem: MARINA
  • Carro Rei, (Longa-metragem gravado em 2019 – em fase de pós-produção) – Direção: Renata Pinheiro/PE – Personagem: MARILEDE;
  • A Salamandra, (Longa-metragem gravado em 2019 – em fase de pós-produção) – Direção: Alex Carvalho/PE – Personagem: PROPRIETÁRIA

Be the first to comment

Leave a Reply

Seu e-mail não será divulgado


*