Texto: Não existe almoço grátis (dir. Rívis)

Texto: Matheus Costa. Revisão: Larissa Lisboa. Imagem: divulgação.

Gostaria de começar este texto a partir de um relato. No dia 17/12/2021 peguei um Uber para assistir a intervenção da Mostra Sururu realizada na Praça Padre Cícero situada no Benedito Bentes. A intervenção foi sobre a sessão sentir. Quando comecei a prestar atenção estava passando Não existe almoço grátis. Confesso que deparei-me com uma sensação de estranhamento e uma conotação reflexiva.

Por isso, adoraria tentar trazer essas sensações e percepções que o curta-metragem me acarretou. Mas já adianto que existe uma certa impossibilidade de traduzir em palavras uma vivência, o que Vygotsky chamou de inefabilidade, no entanto, não custa nada tentar. Além disso, esse texto não vai abordar o curta-metragem, por isso, se for sua intenção ler uma resenha do filme, posso indicá-lo textos incríveis.

Entretanto, não posso dá-lo uma resenha, apenas uma parte de uma vivência parcial, tendo em vista, que escrevo a partir de uma lembrança que em lembrar perdesse no tempo e espaço do que em um momento foi.

Vamos começar pelo estranhamento, o curta fez-me perguntar-me porque gostamos tanto de complicar relacionamentos. Ou porque observamos o outro como um corpo de dominação, aliás, seria possível ter um relacionamento autêntico em um contexto de dominação no qual o outro cessa a relação de troca, para me obrigar a ser uma idealização sua?

Não existe almoço grátis me fez relembrar como foram e estão os seus relacionamentos. Confesso que é preciso ter coragem para perceber os seus comportamentos indesejados que acarretam em um mal-estar no outro, ou melhor, seus comportamentos abusivos. E que muitas vezes, achamos melhor não percebê-los ou não ter consciência deles, como já somos amigos, fala-lhe, não é.

Como um pequeno grande livro vem anunciado há tempo, “tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”, ou mais adequado para o contexto, “tu te tornas eternamente responsável pelos os seus comportamentos abusivos”. Mas não entenda isso como uma interdição, vê nisso uma chamada para que possamos construir relacionamentos mais saudáveis.

Pois, não somos educados para ter, mas podemos nas contingências da vida buscar maneiras de melhorar. E eu não tento me anular nesse processo porque estou no meio dele, e vendo como é difícil ter uma relação de troca justa. Se você não sabe como começar, falo-te, não há amor ou relacionamento em um contexto de dominação.

Aliás, Fanon traz isso ao afirmar que há uma impossibilidade de aparecer um amor autêntico em um contexto de apego aos processos de racialização. Bom, Foucault tem uma frase famosa que diz “Não se apaixonem pelo poder”. Vale destacar que, a concepção de poder em Foucault tem seus pormenores.

Se eu ainda não conseguir convencer-te, dá-me só mais um pouquinho do teu tempo. Em 2019, o número de casos de feminicídios foi 1.326, ou seja, 1.326 mulheres tiveram suas vidas ceifadas. E quando não falamos das consequências da violência simbólica, psicológica e sexual que milhares de mulheres estão expostas dentro da sua própria casa.

Bem contraditório, né? O local que deveria ser de proteção e abrigo, tornou-se em um lugar de guerra. E eu não poderia falar sobre isso sem falar sobre masculinidade, vamos falar o português simples. Não sabemos lidar com as demandas do outro nos relacionamentos, e achamos que impor um modelo é a maneira mais prática de resolver tudo.

Soma-se a isso, a famosa frase, “homem não chora”, e várias porções de machismo, resultado, comportamentos abusivos e relacionamentos destrutivos. Mas, sabe de uma coisa, não há como manter uma relação desumana sem perder um pouquinho de humanidade.

E por isso, eu gostaria de agradecer ao Não existe almoço grátis e realmente não existe mesmo almoço grátis. Que possamos entrar em um relacionamento mais saudável e saber a hora de dizer adeus. Porque no final, tudo o que vai sobrar são lembranças e o que restou de nós.

Obrigado Não existe almoço grátis.   

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