Cinema em Alagoas: a construção poética do audiovisual chega ao seu centenário 

Texto: Emanuella Lima. Revisão: produtoras do Festival Alagoanes.

“Casamento é Negócio?” dirigido e produzido por Guilherme Rogato foi o único filme do cineasta que resistiu ao tempo 

Desde que surgiu através da invenção cinematográfica dos irmãos Lumière* em 1895, o cinema que conhecemos já foi palco de grandes histórias, triunfos e perdas ao longo do tempo.

Em 2021, o cinema em Alagoas completa cem anos de registro e exibições. O cinema foi abraçado pelas terras alagoanas, como conta o livro Panorama do Cinema Alagoano, escrito por Elinaldo Barros**, em 1983. 

O escritor relata que Maceió, a capital de Alagoas, já havia recebido aparelhos precursores do cinema, antes mesmo de sua consolidação como espaço de exibições e produções cinematográficas feitas no estado.

O primeiro kinetoscópio, uma caixa utilizada para exibições de filmes, chegou em Maceió, em dezembro de 1895, criado pelo cientista Thomas Edison, vinte e seis dias antes da primeira sessão de cinema dos irmãos Lumière, onde através de um visor, o espectador vislumbrava desenhos ou fotografias que se mexiam quando a manivela era acionada.  Esse e outros aparelhos só permitiam a visualização de uma pessoa por vez ou em pequenas projeções.

Um pouco mais tarde no ano de 1908, houve a primeira exibição pública de cinema, em um casarão na praça dos Martírios, a exibição foi realizada com um cinematógrafo, um equipamento de fotografia mais moderno que permitia as exibições de imagens para um público maior, o aparelho passou a funcionar no Teatro Maceioense, que depois ficou conhecido como Cine-Teatro Delícia.

No ano 1919 o italiano Guilherme Rogato desembarcava em Alagoas e alguns anos após sua chegada, o jovem que trouxera em sua bagagem máquinas de cinema, passou a rodar seus próprios filmes produzidos em nosso Estado, apesar dos aparelhos para reprodução de fotografias e imagens que faziam alusão ao movimento terem chegado antes, foi com Rogato que o cinema passou a ser produzido em terras alagoanas, mas precisamente em Maceió. 

Guilherme Rogato ( 1898-1966)

Rogato já havia vindo a Maceió antes, para uma Exposição de Fotografia em Esmalte, junto com seus pais imigrantes, mas só retornou definitivamente para a cidade quando já estava um pouco mais velho com o objetivo de instalar um atelier de fo­tografias, na Rua 15 de Novembro, 89.

Filmografia de Rogato

O jovem italiano trazia em sua bagagem, a “inovação”, ao contrário do que ocorreu com alguns filmes pionei­ros feitos no Brasil, que imitavam os trabalhos dos irmãos Lumière, captando a chegada de um trem à estação, ou a saída dos operários de uma fábrica, Rogato registrou o carnaval de rua e a inauguração de uma ponte no município de Que­brangulo.

Em abril de 1921, acontecem os primeiros filmes produzidos em Alagoas intitulados como Carnaval de 1921 e A Inauguração da Ponte de Cimento em Victória, os dois curtas foram exi­bidos ao público maceioense no dia 7 de abril de 1921, no Cine-Teatro Floriano. 

De acordo com Barros (1983), a terceira filmagem do cinegrafista Guilherme Rogato ainda aconteceu neste mesmo ano, quando em junho ele registrou num filme uma festa em homenagem ao então reeleito governador do Estado, José Fernandes de Barros Lima. No dia 11 do mês seguinte o filme foi exibido especialmente para políticos, autoridades e jornalistas, no Cine Moderno.

Rogato foi o precursor do cinema em Alagoas, e ainda produziu alguns filmes até a chegada do pernambucano Edson Chagas em 1930, que estava vivendo o surto ci­nematográfico de Recife, e foi realizador de Aitaré da Praia (1925), considerado como um importante filme da cinematografia bra­sileira. 

O cineasta pernambucano aproveitou sua estadia em Alagoas para produzir filmes e estabelecer contato com Rogato. Bravo Nordeste foi uma das produções do cineasta registrada no Estado, como conta Elinaldo Barros em seu livro, mas apesar de seu entusiasmo, Chagas voltou a Pernambuco pouco tempo após sua chegada, levando na bagagem a produção. 

Chama acesa

Apesar do sumiço e partida do Pernambucano, a chama de realizar filmes de ficção continuava acesa no coração de Rogato. Questões borbulhantes da existência do petróleo na região praieira de Riacho Doce e em outras localidades de Alagoas, chamaram a atenção do italiano. 

No ano de 1933, Rogato produz o segundo longa-metragem alagoano: Casamento é Negócio?, produzido pela Gaudio-Film, empresa liderada por Guilherme Rogato, que está disponível para ser assistido no site do Alagoar

Imagem do filme “Casamento é negócio?”, (1933).

O longa-metragem, o único filme de Rogato que resistiu ao tempo, foi lançado em 7 de abril de 1933, no Cine Capitólio e se tornou um marco inicial importante para o cinema alagoano, contando a história de um espião norte-americano, que veio a Maceió com a missão de destruir uma companhia de petróleo.

Após a realização deste filme, o pioneiro da cinematografia alagoana, Rogato, deixou o diletantismo da atividade cinematográfica pelas exigências do dia a dia da labuta de comerciante.

O precursor do cinema alagoano, Guilherme Rogato, morreu em 1966. Após sua morte se iniciou a fase moderna do cinema em Alagoas com o surgimento, segundo Elinaldo Barros,  e consolidação da Caeté Filmes do Brasil que realizou um intenso trabalho de documentação e registros cinematográficos em Alagoas.

*Louis e August Lumière, também conhecidos como irmãos Lumière, são reconhecidos como inventores do cinematógrafo, aparelho que realizava filmagens e também utilizado para a projeção de filmes. A data em que apresentaram publicamente o cinematógrafo em 28 de Dezembro de 1895, na primeira sala de cinema na França, é celebrada como o nascimento do cinema.
**Elinaldo Barros é autor dos livros Panorama do Cinema Alagoano (1983 e 2010), Cine Lux – Recordações de um Cinema de Bairro (1987) e Rogato – A Aventura do Sonho das Imagens em Alagoas (1994) – a capa deste último livro está na imagem em destaque.

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