Crítica: Corpo D’Água (Direção Coletiva)

Texto: Franklin Lessa. Revisão: Leonardo Amaral e Larissa Lisboa.

O que o fundo da lagoa ainda pode nos revelar

A produção de estreantes no cinema é fascinante por si só. Saber que novos realizadores estão surgindo para fomentar o audiovisual alagoano é tocante e enche de esperança os olhos daqueles que tanto admiram essa cultura. Assim, o Ateliê Sesc de Cinema há 10 anos tem motivado novas turmas a realizar obras que reverberam a representação de Maceió nas telas. O penúltimo trabalho lançado pelo projeto foi o documentário com direção coletiva, Corpo D’Água (2018).

A obra decide mostrar a Orla Lagunar de Maceió como um dos mais diversos e belos pontos da cidade, ao invés de focar apenas em possíveis mazelas que rodeiam a região. O curta traz uma filmagem impecável e por este motivo ganha destaque. Não restam dúvidas quanto a beleza da Lagoa Mundaú e que o contato com a natureza é palpável através das imagens que somos presenteados no decorrer do filme.

As falas em off são um recurso bastante utilizado durante os quase 10 minutos de duração e traz as vozes de residentes da região, enquanto imagens de apoio ilustram o descuido local e contrastam com filmagens aéreas (tão bonitas) capturadas do lugar. Mas interrompendo as falas dos moradores, há uma narradora que traz citações de um texto mais literário e poético, inclusive, foi dessa maneira que a abertura do documentário conseguiu chamar atenção. O primeiro momento segurou a ideia de podermos ver um lado esquecido da cidade. Por nós, pelo turismo, pelo governo.

A orla lagunar e o povo daquela redondeza têm uma participação importantíssima na cultura local e, consequentemente, desperta o desejo de realizadores, pesquisadores e curiosos a expor fatos que a grande mídia tradicional não apresenta. Todavia, um trabalho que inicia com uma crítica em relação ao esquecimento dessa importância, pode ter cometido o pecado de se tornar esquecível. Dado pela falta de consistência do roteiro que até consegue passar uma mensagem, mas além de não impactar o suficiente, traz uma abordagem aparentemente sem foco. O filme acabou e fiquei esperando algo mais.

Se considerarmos outra perspectiva, é compreensível e interessante Corpo D’Água ter optado por um caminho mais cuidadoso. Em alguns temas delicados, quando não há uma dosagem ideal, a linha acaba seguindo para o sensacionalismo. A tentativa dos realizadores me causou a impressão de que pode ter sido uma ideia para popularizar a região não tão explorada pelo restante do município. Assim como a prefeitura trabalha incessantemente a fim de “mercantilizar” a orla marítima, através de imagens belíssimas veiculadas na televisão e internet.

Mas, nosso cinema é uma arma forte, perpetua para sempre e é um agente transformador na sociedade. Ao propor retratar a realidade de um povo ou lugar, vem atrelada a grande responsabilidade de manter tal cultura viva na história. Por conseguinte, quem possui sensibilidade na hora de ouvir e dar vozes aos personagens pode cumprir com mais destreza o intuito de que haja representação nas telas.

O que tem no fundo da lagoa? Uma parte da população continua sem saber. Contudo, paira em mim o desejo de que, por meio de Corpo D’Água, muitos olhos se voltem aguçados à região. Assim como fiquei estimulado em ver a ousadia, acompanhar o amadurecimento e conhecer a profundeza dos trabalhos futuros dos realizadores: Aline Alves, Camila Moranelo, Dávison Souza, Elizabete França, Isadora Padilha, Ítalo Rodrigues, Marina Bonifácio, Marcela Farias, Maykson Douglas e Nycollas Augusto.

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