Crítica: Sargaço (dir. Yuri Melo)

Texto: Céuva. Revisão: Tati Magalhães

Ela está prestes a morrer, mas o cinema não

O amor é um construto que ceifa a ignorância de não atentar a dor do outro, assim se faz Sargaço, na beira de um mar, sem qualquer esperança à praia. Dona Ziê mostra em poucas cenas tramas de preocupação que dão o tom que a montagem pouco entrega. Com uma narrativa que se ancora em um roteiro mal trabalhado, o filme atenua construções de perda, dor e desistência. São poucas camadas em uma história densa que tornam o enredo interessante, na margem de uma atuação que também poderia ter sido melhor orquestrada. Acredito que todos entendam a complexidade que mora por trás de um câncer, mas até que ponto devemos nos preocupar junto às personagens, se ante tudo o que o filme nos mostra, não fica claro que se está à beira da morte? Porém, ela vai morrer.

Fica a cargo do espectador desvendar algumas informações que a direção deixou passar, seja nos diálogos ou na decupagem. A abertura deixada na narrativa causa uma ruptura na sensação do filme, quando as decisões que foram tomadas não ficaram claras no produto. É importante lembrar que o filme se lança a expressar uma paixão direta frente à premissa, o debate das escolhas feitas se estende aqui, restando o suspiro de um fim amarrado, mas em muitos momentos, a dúvida, infelizmente, fica.

Bia já se deixou levar pela morte, e por mais que ame seu companheiro, não há mais o que possa ser feito além de aceitar o destino e se entregar ao mar. Mas ela realmente se entregou ao mar, ou espera por Léo na beira da praia?
À primeira vista, o filme defendido pelo diretor é interessante, com imagens bem feitas, alguns ruídos que distraem a atenção, uma montagem que é usada de forma inteligente pontualmente, além de um roteiro e um nome que instigam uma promessa, mas que deixou a desejar.

Sargaço deixa o espectador em crise, em uma condução narrativa agradável e sentidos dispersos, pois Léo rouba a cena frente a dor de sua amada. O carro estaciona, na espera Bia interpela. Enquanto ouve calada a última fala de Léo.

É sobre os dois? Ou sobre ela e o câncer? Mas seria tão genérica assim a noção que construímos sobre o filme?
Muitos pontos tendem para um debate profundo sobre um cinema que estamos habituados a assistir. Sargaço é um componente importante na curadoria da 14ª Mostra Sururu, pois vai de encontro a uma maré densa, apesar de entregar pouco, salienta com muita iminência a perspectiva de mais portas sendo abertas para artistas independentes e descentralizados do antro cinematográfico alagoano.

Compondo uma atitude ascendente no cenário atual, esperamos cada vez mais que novas experiências audiovisuais cheguem aos olhos do público e resistam à estrutura canônica do cinema local. Precisamos ampliar o discurso da democratização do cinema, já que a pauta existe fruto da concentração dos acessos que acarreta a poda de artistas subalternizados.

Sargaço então, traçando uma trajetória importante para as produções alagoanas, deixa sua marca como primeiro filme de Yuri Melo. E constrói junto a outros artistas na Mostra a lança de resistência, esperança e espaço de que precisamos para sobreviver em um país que estende um débito com a cultura, e que cada vez mais excluí produções da margem. Ainda há muito a ser aprendido, mas a iniciativa, por isso, tem o seu prestígio.

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