Crítica: O Canto (dir. Izabella Vitório e Isadora Magalhães)

Texto: Luís Otávio Mendonça. Revisão: Tati Magalhães

O canto que reverbera

‘O Canto’, de Izabella Vitória e Isadora Magalhães, é um filme sobre o tempo e para ele. Ao falar da vida das destaladeiras de fumo de Arapiraca, a dupla de diretoras cria momentos de força imagética e sonora, onde a música atua como um fio narrativo que resgata a tradição e a conduz à posteridade, como preservação.

Filmado no agreste alagoano, o filme mergulha no sensorial para falar da importância dessas mulheres, personagens do imaginário cultural e histórico de Alagoas. O início bonito, onde imagem e som parecem ainda encontrar a harmonia certa, embora coerente com a proposta do filme, pode trazer um certa resistência ao ritmo da obra, que requer imersão e paciência. O que segue são imagens cuidadosamente compostas, de ambientes que refletem temas como ancestralidade e resistência. Seja nas cenas no campo, no interior de casas humildes, em fábricas soturnas ou ao ar livre, em grupo ou sozinhas, aqui, predominando a Mestra Rosália Gomes, as destaladeiras surgem como figuras que pulsam e que parecem atravessar o tempo.

Sua representação ganha um aspecto de entidade e também de canal de manutenção da história e cultura local, pelo coro que ecoa os lamentos, as dores, as lembranças e temas ligados à vida e ao trabalho no campo. Pelas mesmas mãos enrugadas que separam o fumo, elas regem o pandeiro e impõem o ritmo do filme.

Gostaria de ter estado um pouco mais nessa experiência proposta, dado os momentos de catarse que ela possui. É bonito ver como a música exerce aqui o papel de contextualizar e de celebrar a tradição e o final, que parece explodir a cada palavra cantada, reforça isso. Mesmo quando a obra termina, ela reverbera uma mensagem clara, bonita e viva de que a memória resistirá enquanto houver quem conte, registre e cante, a plenos pulmões.

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